Dia Mundial Sem tabaco e a importância da Cessação Tabágica

No passado 31 de Maio assinalou-se o Dia Mundial Sem Tabaco e nesse sentido, o jornal Médio Tejo entrevistou o Dr. Pedro Sousa – co-fundador do De Boa Saúde – onde entre outros destaques, falou acerca da importância da cessação tabágica. Transcrevemos o artigo na íntegra que foi publicado em MédioTejo.net com autoria de Paula Mourato.
Eis o artigo:
“O Dia Mundial Sem Tabaco foi criado pelos Estados-membros da Organização Mundial de Saúde (OMS) em 1987 e é assinalado todos os anos a 31 de maio. O objetivo da data é aumentar a consciencialização sobre os efeitos prejudiciais do uso do tabaco e da exposição ao fumo passivo, e desencorajar o uso do tabaco em qualquer uma de suas formas.
O tema deste ano é “Tabaco: Ameaça ao nosso Ambiente”, chamando a atenção para os prejuízos do cultivo, fabrico e produção que o tabaco provoca na nossa saúde e no planeta.
Além do impacto negativo da indústria do tabaco, com o cultivo a ser responsável por 5% do desmatamento de florestas, “os produtos do tabaco, que são o lixo mais atirado para o chão no planeta, contêm mais de 7.000 compostos químicos que, uma vez descartados, espalham-se no meio ambiente”, sublinhou Rüdiger Krech, diretor do Departamento de Promoção da Saúde da OMS, em declarações à agência France-Presse. “Cada uma das 4,5 mil milhões de pontas de cigarro que, por ano, vão parar à natureza, pode poluir até 100 litros de água”, realça.
Falando particularmente da saúde dos seres humanos, quase todos os cancros surgem mais nos fumadores, mesmo aquele tipo de cancro que se pensaria não ter como causa o tabaco, como por exemplo na mama. Mas, no fumador, além do risco acrescido de cancro do pulmão ou da boca, o tabaco é a principal causa de outras doenças, entre elas a Doença Pulmonar Obstrutiva Crónica (DPOC), as doenças cardiovasculares e as cerebrovasculares.
Contudo, os malefícios estendem-se além da saúde. Desde logo começam por pesar na carteira, embora o tratamento para um fumador que esteja decidido a deixar de fumar também seja dispendioso, com a desvantagem de não se retirar prazer da ação. Daí a importância da determinação e da vontade vincada de querer deixar de fumar, como explicou ao nosso jornal o médico Pedro Ferreira de Sousa, coordenador da USF Almonda, em Torres Novas.
Para essas pessoas surgiu a Consulta de Apoio Intensivo à Cessação Tabágica (CAICT) que o Agrupamento de Centros de Saúde do Médio Tejo disponibiliza em Torres Novas. Antes da pandemia, o ACES Médio Tejo começou a desenvolver as Consultas de Cessação Tabágica, criando consultas na USF Fátima, USF Almonda e na USF Cardilium.
Durante a pandemia esta atividade foi afetada, estando o ACES, paulatinamente a reabrir esta valência. Neste momento, estão a funcionar em pleno as Consultas de Cessação Tabágica na Unidade de Saúde Familiar Almonda. Nessa Unidade a consulta funcionou de forma ininterrupta durante a pandemia, embora com ajustes e consultas não presenciais, garantiu Pedro Sousa, um dos profissionais de saúde que incentivam e ajudam os doentes a deixar o vício do tabaco.
Segundo os dados da USF Almonda (desde novembro de 2017 até agosto de 2021) o total de primeiras consultas cifra-se nas 128, e em seguimento contabiliza-se um total de 367 consultas. “A pandemia condicionou muito estes números. Poderiam ser muito mais expressivos, não fosse o impacto da pandemia com todas as atividades que estão inerentes à nossa prática clínica, como é do conhecimento geral”, admite o médico, falando, no entanto, “numa boa procura”.
“Muitos destes utentes já fizeram tentativas prévias sozinhos e que não correram bem. Muito até recorreram a medicação sem a devida supervisão e por isso também têm um feedback negativo em relação à possível melhoria com a mediação do processo da cessação tabágica”, afirma.
Em Portugal, as primeiras consultas para deixar de fumar caíram para metade em 2020 e o número de locais de consulta baixou 35%, um retrocesso que o último relatório do Programa Nacional para a Prevenção e Controlo do Tabagismo atribui à pandemia.
Segundo o documento, devido à pandemia de covid-19, em 2020 registou-se uma quebra de 39,2% consultas realizadas, sendo a quebra mais acentuada nos agrupamentos de centros de saúde do que a nível hospitalar. De acordo com os dados fornecidos pelas administrações regionais de saúde, em 2020 foram atendidos 6.129 utentes (primeiras consultas), uma redução de 51,7% relativamente a 2019. Algumas consultas só mantiveram o acompanhamento de utentes já inscritos, não aceitando utentes de primeira vez.
No que se refere às consultas de apoio intensivo à cessação tabágica, em 2020 foram realizadas 25.486 nos agrupamentos de centros de saúde e em serviços hospitalares.
De acordo com Pedro Ferreira de Sousa, a consulta é procurada por fumadores com diversas motivações. “Ou já fizeram várias tentativas, ou desejam deixar de fumar, seja pela saúde seja pelo impacto no dia a dia. Pesam os fatores económicos, o impacto nas pessoas que os rodeiam, nomeadamente pessoas que têm filhos menores, entre outras situações”, enumera. Não raras vezes, “existe aquilo que se chama de passa a palavra, ou seja conhecem um familiar ou um amigo que foi à consulta, que esteve no processo durante alguns meses e foi bem sucedido, e acaba por ter um efeito positivo”.
E será a CAICT um último recurso? “Depende, temos de tudo!”, afirma o médico. Na consulta da USF Almonda os utentes “são de várias idades, de vários contextos, de várias profissões, de vários estratos sociais. Não há um utente tipo, porque não há um fumador igual. Existe uma série de padrões, de vivências, que fazem com que esta consulta tenha um desafio acrescido, uma vez que não há um tratamento tipo. Embora exista um plano de consulta, uma parte estruturada, temos de ser flexíveis, de adaptar quer as linguagens, as estratégias, e a parte medicamentosa”, explica.
A consulta no ACES do Médio Tejo
A CAICT é uma consulta estruturada de apoio intensivo ao fumador, realizada por profissionais de saúde com formação especializada em cessação tabágica, que engloba, na maioria das situações, uma abordagem farmacológica associada a uma mudança comportamental, orientada para o fumador.
O trabalho de proximidade do médico e enfermeiro é considerado um elemento essencial para o processo de cessação tabágica, por isso foram criadas “duplas” de trabalho. Na primeira CAICT, o primeiro contacto (no caso com um enfermeiro especialista), é um elemento chave para o conhecimento do utente, nomeadamente a relação que tem com o tabaco – passada e presente –, mas também todos os outros problemas de saúde, medicação habitual e antecedentes familiares.
Assim, o enfermeiro é responsável pela avaliação global dos parâmetros gerais como o peso, a altura, a pressão arterial, contexto do utente, que tipo de tabaco fuma (do clássico ao aquecido, de enrolar, etc), há quanto tempo fuma, fatores de motivação ou o grau de dependência dos utentes à nicotina. São ainda avaliados outros hábitos, designadamente o consumo de outro tipo de substâncias ou até mesmo o número de cafés ou bebidas energéticas ingeridas por dia.
O que leva os utentes à consulta? Passa por “sentirem que têm um compromisso, um apoio, que já não estão sozinhos no processo mas têm uma equipa que os acompanha, que os motiva e que acaba por fazer parte do sucesso do tratamento”, refere o médico.
O mais importante para deixar de fumar é a motivação. E a certeza de que esta não é uma corrida de 100 metros, mas uma maratona, diz o médico Pedro Sousa.
Após a avaliação, e recolhidas as informações que caracterizam aquele utente específico e traçam um perfil, é então recebido pelo médico “para uma abordagem mais dirigida”, no sentido de traçar um plano de tratamento, num processo individualizado, para que os utentes criem estratégias, nomeadamente se a dependência do tabaco exige um trabalho do ponto de vista comportamental.
Contudo, os utentes na USF Almonda não dispõe de acompanhamento psicológico. “Numa consulta ideal deveria haver, além do apoio médico e de enfermagem. Deveríamos ter apoio de uma psicóloga e de uma nutricionista. A psicóloga precisamente para trabalhar a parte que referi, e que é essencialmente feito por mim e pela enfermeira, porque não temos outros recursos. Temos uma psicóloga para todo o concelho de Torres Novas e já faz um excelente trabalho mas não pode atender a este tipo de casos, porque há outras situações prioritárias. Mas seria de facto uma excelente ajuda”, reconhece.
Quanto à nutricionista, “está a ser pensado, mas neste momento não temos esse recurso. É importante porque invariavelmente, a maioria para não dizer a totalidade dos fumadores, sobretudo na fase inicial do processo, quando deixam absolutamente de fumar, há sempre um aumento de peso. Procuramos combater com estratégia alimentar e temos folhetos alusivos a este problema, mas sem dúvida que o apoio mais próximo de uma nutricionista seria de grande ajuda”, diz.
Pedro Sousa vinca que a CAICT é destinada a utentes determinados, “realmente motivados” a deixar de fumar. “Que têm consciência dos malefícios do tabaco, que estão determinados a fazer uma tentativa e querem apoio. Se os utentes não estão motivados, convém primeiro trabalharem essa parte com o médico de família e então depois fazerem a referenciação para a Cessação Tabágica”, aconselha.
Medicamentos para ajudar a deixar de fumar permanecem sem comparticipação
Em 2017, os jornais anunciavam que os medicamentos antitabágicos, como a vareniclina, e sujeitos a receita médica, teriam uma comparticipação de 37 por cento. Até se admitia a possibilidade de, no futuro, haver distribuição gratuita nos centros de saúde de medicamentos de substituição de nicotina, como os pensos transdérmicos. Estes continuam a ser os mais utilizados, apesar de não terem ainda qualquer comparticipação, o que pode ser explicado por serem de venda livre e o seu acesso por parte dos utentes ser mais fácil.
Se nem todos os fumadores necessitam de medicação para deixar de fumar, dependendo do grau de dependência, muitos têm de recorrer a medicamentos. Mas as opções não são muitas. Recentemente, a Pfizer retirou do mercado um dos fármacos mais usados no tratamento do tabagismo (Champix), por conter um composto cancerígeno. Um outro medicamento, o Dextazin, custa entre os 90 e os 100 euros, a cada 25 dias. O único medicamento comparticipado que é usando na cessação tabágica é o antidepressivo Bupropion”, dá conta o médico, acrescentando que “uma caixa para um mês custa cerca de 30 euros, mas não pode ser usado em todos os utentes, apenas em situações mais específicas”.
A maioria dos tratamentos para deixar de fumar não têm comparticipação do SNS, podendo custar cerca de 100 euros por mês
Pedro Sousa fala numa “luta desigual” com a indústria tabaqueira. “Um maço de tabaco neste momento custa cerca de 5 euros, mas a medicação que habitualmente é usada para a cessação tabágica é muito cara.” Mesmo uma simples caixa de pensos para duas semanas – para a terapêutica de substituição de nicotina – custa cerca de 50 euros, e não é comparticipada, nota o médico. Embora reconheça que fazendo as contas, o custo mensal em tabaco pode ser equivalente ao preço da medicação, lembra que “custa menos dar cinco euros por dia do que adiantar logo 50 ou 90 euros para um tratamento”.
Para o coordenador da USF Almonda “bastaria haver alguma comparticipação ou até em alguns casos ceder gratuitamente alguma desta medicação aos utentes, como se faz com com os contraceptivos na consulta de Planeamento Familiar. Podia ser feito nas consultas de Cessação Tabágica, por exemplo, seria uma excelente ajuda”.
A importância do exemplo
Nos maços de tabaco, as advertências textuais e gráficas chocantes (especialmente aquelas que incluem imagens) podem persuadir os fumadores a proteger a sua saúde e a dos não fumadores. Setenta e oito países, incluindo Portugal, aplicam estas advertências gráficas, incluindo advertências no idioma local e a exigência de que elas ocupem, em média, pelo menos metade da frente e verso dos maços de cigarros.
Todavia, Pedro Sousa lembra que “até há pouco tempo os próprios médicos promoviam o tabaco e fumavam dentro do consultório. Há muitos utentes que ainda têm essa imagem presente na sua memória”. Por isso, defende ações de sensibilização, criação de bons hábitos junto da população – na escola, locais de trabalho, junto de mulheres grávidas, meios familiares – não só dos utentes mas dos próprios médicos e do exemplo que é necessário dar, sempre numa perspetiva “não discriminativa”, mas envolvendo a pessoa no processo.
As taxas de sucesso de quem tenta deixar de fumar não são elevadas, mas nesta “guerra”, cada vitória conta. Pedro Ferreira de Sousa diz depender de cada fumador. “Alguns precisaram de duas semanas, outros precisaram de um mês, outros dois meses, outros seis meses. Cada caso é um caso. E podem existir lapsos e recaídas”, nota.
A taxa de sucesso da Consulta de Cessação Tabágica em Torres Novas, e que segundo o médico vai ao encontro da maioria das consultas no País, é de cerca de um terço. “Ou seja, mesmo com esta consulta especifica, dirigida, com apoio”, em média apenas um em cada três pacientes consegue manter-se sem fumar.
O sucesso dos tratamentos não é garantido. Há muitas recaídas. Mas 1 em cada 3 pacientes consegue manter-se sem fumar
A equipa da CAICT acompanha o fumador enquanto decorre o processo e nos seis meses seguintes após deixar de fumar. Quando entra na chamada “fase de manutenção” – sem existência de lapsos ou recaída –, o utente tem alta, mantendo contudo o acompanhamento, recebendo uma chamada telefónica seis meses depois e um ano depois, no sentido da equipa perceber como se encontra o paciente.
O médico reconhece que é uma taxa de sucesso aquém do desejado e acredita que esta poderia “ser melhorada se os utentes tivessem outro tipo de apoio em relação à medicação”, e se houvesse “outro tipo de margem em relação à disponibilidade para esta consulta”.
Significa isto que, no caso do médico Pedro Sousa, tem de acumular esta área – da qual diz gostar muito – com a sua lista de mais de 1.800 utentes e com a função de coordenador da Unidade de Saúde Familiar Almonda, o que lhe deixa poucas horas para a Cessação Tabágica.
“Uma forma de colmatar seria termos mais pessoas formadas. Este ano tivemos dentro da nossa equipa, formados recentemente num curso de Cessação Tabágica da ARSLVT, mais uma médica, uma enfermeira e uma interna de especialidade de Medicina Geral e Familiar. Assim que começarem a cooperar, vamos ter mais oferta neste tipo de consulta. Idealmente, se todos os profissionais de saúde pudessem fazer duas horas por semana dedicada só à Cessão Tabágica, iria ter um impacto extraordinário”.
Produtos alternativos com efeitos adversos e malefícios
A OMS estima que, todos os anos, o tabaco mate mais de 8 milhões de pessoas. Destas, cerca de um milhão morrem por exposição ao fumo passivo.
Na tentativa de atenuar estes números, sugiram alternativas aos cigarros convencionais, como o cigarro eletrónico, que oferece nicotina líquida ou diferentes líquidos, aquecidos e vaporizados, permitindo a inalação.
Por não conterem tabaco nem estarem dependentes de temperaturas muito elevadas, generalizou-se a ideia de excluírem os resultados adversos associados ao fumo dos cigarros. Contudo, a Sociedade Portuguesa de Pneumologia (SPP) alerta que tais produtos não são inócuos e os aromas introduzidos (chocolate, menta, etc) podem formar substâncias tóxicas.
Mais recentes são os dispositivos de tabaco aquecido, afirmando menor toxicidade, ou seja sem os malefícios da combustão por, a temperaturas mais baixas, conseguirem libertar a nicotina.
“Os produtos de tabaco aquecido originam aerossóis com nicotina, e além da nicotina têm outros produtos tóxicos que são inalados por quem os utiliza. E a indústria tabaqueira apresenta um produto, não dizendo que é bom, mas dizendo que faz menos mal que o cigarro convencional. Não é correto afirmar que estes produtos de tabaco aquecido são mais seguros que o cigarro convencional. Existem uma série de malefícios já comprovados, e outros por comprovar, que mostram que este tipo de tabaco não é de todo uma alternativa segura”, garante o médico.
“Neste momento são uma moda, mas são prejudiciais”, alerta Pedro Sousa. Revelam-se particularmente atrativos para os jovens, muito pelo design moderno que apresentam, e a Sociedade Portuguesa de Pneumologia denunciou já casos de ‘influencers’ ou ‘bloggers’ pagos para publicitar os cigarros eletrónicos e tabaco aquecido.
Acresce que a permissão de fumar nas discotecas e bares noturnos, locais de socialização dos adolescentes e jovens adultos, duplica a probabilidade de um jovem se tornar fumador regular.
A Sociedade Portuguesa de Pneumologia denunciou já casos de ‘influencers’ ou ‘bloggers’ pagos para publicitar os cigarros eletrónicos e tabaco aquecido.
“Não estamos a conseguir travar o consumo dos cigarros eletrónicos nos jovens, que já se aproximam muito do consumo dos cigarros tradicionais no grupo etário dos 13 aos 18 anos”, lamenta a pneumologista Sofia Ravara, da Comissão de Trabalho de Tabagismo da SPP, em declarações à Lusa.
Por outro lado, diz, o padrão que existe é da “múltipla experimentação”, o que considera preocupante. “Há uma acumulação de experiências de experimentação”, desde os cigarros eletrónicos, ao cachimbo de água, o tabaco aquecido, que levam ao “reforço da dependência” porque são produtos “altamente aditivos e a sua regulação é muito mais difícil”.
Questionada sobre as razões de os jovens continuarem a fumar quando há tanta informação sobre os malefícios do tabaco, Sofia Ravara afirma que “educar não basta, é preciso regular as atividades de ‘marketing’ da indústria e restringir as oportunidades para fumar nos locais públicos, incluindo à saída das escolas e discotecas”.
Já o médico Pedro Sousa confirma que à consulta chegam utentes que experimentaram esse tipo de produtos. “Acham que não estão a fazer tão mal ao organismo, mas estão”. Nesse sentido defende a promoção “de forma ativa de campanhas de sensibilização, nas escolas e nos locais de trabalho, porque infelizmente o tabaco continua a ser uma causa de morte importante a nível mundial. E também de incapacidade: não podemos esquecer que há muitos utentes que podem não morrer de cancro mas desenvolvem doenças que os limitam substancialmente no seu dia a dia. A forma como estes produtos são promovidos é falaciosa, porque continuam a fazer mal. A indústria tabaqueira é que não quer perder clientes, logicamente!”.
O médico acrescenta que “infelizmente existe muita publicidade enganosa, as pessoas vão muito pela novidade e não se apercebem bem do que estão a consumir. Cabe-nos desmistificar essa informação e dar-lhes ferramentas para que possam tomar as suas próprias decisões”.
Deixar de fumar: Benefícios a curto, médio e longo prazo
Deixar de fumar definitivamente é um processo físico e mental que pode levar tempo. Mas os benefícios são muitos. A saúde melhora quase de imediato, mas sobretudo, a longo prazo. Por exemplo: 20 minutos após o último cigarro, a frequência cardíaca e tensão arterial descem; 12 horas após o último cigarro, os níveis de monóxido de carbono no sangue voltam ao normal; Entre duas e doze semanas após o último cigarro, a circulação sanguínea melhora e a função pulmonar aumenta; Entre 1 e 9 meses após o último cigarro, a tosse e a falta de ar diminuem; 1 ano após o último cigarro, o risco de enfarte do miocárdio (ou ataque cardíaco) é cerca de metade do de um fumador; Entre 2 a 5 anos após ter deixado de fumar, o risco de acidente vascular cerebral é aproximadamente o mesmo de uma pessoa que nunca fumou; No espaço de 5 anos, o risco de cancro da boca, garganta e esófago é reduzido para metade. O risco de cancro da laringe e do colo do útero também diminui; Dez anos depois de ter deixado de fumar, o risco de cancro do pulmão é metade daquele que um fumador apresenta.
1 ano após o último cigarro, o risco de enfarte do miocárdio (ou ataque cardíaco) diminui para metade
Pedro Sousa reconhece, no entanto, que a ansiedade na vida de uma pessoa que deixa de fumar “pode acontecer”. Em média, os sintomas de privação atingem metade dos fumadores, mas “normalmente sentem-se nos primeiros dias e, no máximo, podem durar quatro meses. O fator decisivo é fazer este acompanhamento próximo nos primeiros tempos e a partir daí a pessoa, se tiver essa motivação, conseguirá deixar de fumar”, assegura o médico.
O médico diz que o fundamental é mesmo não começar a fumar, mas importa “promover este assunto na escola, de uma forma regular, periódica, porque é, muitas vezes, aí que tudo começa, as experiências, o contacto com o tabaco e com outro tipo de substâncias”. Portanto, “quanto mais cedo” se atuar preventivamente “melhor”.
Para quem já é fumador importa “que sinta que não é um caso perdido”, alerta. “Muitas pessoas já tentaram deixar de fumar, com tentativas mal sucedidas, com pouco acompanhamento, e isso marca muito. É importante que não fique refém das tentativas mal sucedidas. Não importa quantas vezes a pessoas tentou e quantas vezes não correu bem, o que importa é continuar com o processo. Isto é uma maratona, não é uma corrida de 100 metros”.
O médico deixa um terceiro conselho, lembrando que existem consultas dirigidas para o apoio intensivo à cessação tabágica. “As pessoas devem perguntar no centro de saúde como podem recorrer a esta ajuda, falar com os médicos de família, não se inibirem de expor o assunto e, se de facto estiverem motivadas e quiserem recorrer à consulta, que o façam da forma mais célere possível, porque quanto mais precoce for abordado o tema, maior a taxa de sucesso, e que possam deixar-se envolver neste processo de decisão. Sentirem sempre que é uma decisão partilhada. Não é o médico, nem a enfermeira, nem a equipa que impõe”.
A CAICT no ACES do Médio Tejo não tem uma lista de espera prolongada, conseguindo a equipa da USF Almonda “dar uma boa resposta” às primeiras consultas. Regra geral, o médico reserva uma ou duas vagas para cada semana, ou seja, “ em uma ou duas semanas, no máximo, marcamos a primeira consulta. Depois as consultas de seguimento já são programadas caso a caso, pode ser daqui a uma semana ou daqui a um mês”, explica.
Também o Centro Hospitalar do Médio Tejo disponibiliza aos utentes uma consulta especializada de Cessação Tabágica. É realizada na Consulta Externa da Unidade de Torres Novas do CHMT, todas as terças-feiras.
Durante a pandemia, as consultas foram apenas suspensas durante o primeiro confinamento, entre março e junho de 2020. Atualmente, no CHMT a consulta de Cessação Tabágica faz acompanhamento ativo de cerca de uma centena de fumadores. A consulta é realizada por um médico com pós-graduação em Cessação Tabágica e envolve os meios complementares de diagnóstico disponibilizados pelo CHMT. Outras especialidades podem estar envolvidas, em cooperação com a consulta de Cessação Tabágica, como a Pneumologia, a Cardiologia, a Medicina Interna, a Psiquiatria/Psicologia.
De acordo com as últimas estimativas elaboradas pelo Institute for Health Metrics and Evaluation, em 2019 morreram em Portugal mais de 13.500 pessoas por doenças atribuíveis ao tabaco. Nesse ano, estima-se que o tabaco tenha contribuído para 32,6% dos óbitos por doença respiratória crónica, 19,1% por cancro, 8,5% por doenças cérebro-cardiovasculares, 9,8% por diabetes mellitus tipo 2 e 14,0% por infeções respiratórias do trato inferior.
Estima-se ainda que em Portugal haja entre 600 mil a 800 mil pessoas com Doença Pulmonar Obstrutiva Crónica, mas apenas 130 mil estão identificados nos centros de saúde. O último relatório do Observatório Nacional das Doenças Respiratórias, apresentado em dezembro de 2021, indicava que, em 2019, as doenças respiratórias terão representado uma perda económica de 3,5 mil milhões de euros.
Os últimos dados do Instituto Nacional de Estatística sobre as causas de morte em 2020 revelam que as doenças do aparelho respiratório (excluindo a covid-19) causaram 11.266 mortes.
Consultas de Cessação Tabágica
Os utentes dos concelhos abrangidos pelo ACES Médio Tejo podem fazer a marcação de consultas através do seu médico de família ou contactando a USF Almonda através do e-mail usf.almonda@arslvt.min-saude.pt ou ligando para o número 249 787 446. No Centro Hospitalar do Médio Tejo, as consultas decorrem na Unidade de Torres Nova. A referenciação pode também ser feita através do médico de família, ou diretamente, pelo telefone 249 810 100.”
Fim do artigo publicado a 31.05.2022 em MédioTejo.net da autoria de Paula Mourato
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